terça-feira, 30 de novembro de 2010

Niterói essa doida balzaca

*título de um livros de contos sobre a cidade de Niterói, autor Luiz Antônio Mello.

Na segunda-feira passada (22/11), Niterói ("cidade das águas escondidas" em idioma tupi) fez 437 anos, mas mantendo seu corpinho de trinta... Nasci e fui criado aqui, apesar de gostar do Rio admito que meu coração bate mais forte ao regressar a cidade de Araribóia *

Algumas peculiaridades da minha cidade:


Temos uma cena de hip-hop relativamente importante, destaco os rappers De Leve ( o “Eminem brazuca”), Black Alien (o Mr. Niterói), Speedfreaks e os grupos Oriente-se e Quinto andar. Essa cena começou no rinque de patinação do parque Campo de São bento no bairro nobre de Icaraí. A cena rock da cidade também é forte, com destaque para o movimento “Araibóia Rock” e seus shows na UFF, Ilha da Conceição e Gragoatá;

Na seara cultural, temos o primeiro curso superior de cinema do Brasil, fundado nos anos 70 pelo cineasta Nelson Pereira Santos na Uff (Universidade Federal Fluminense, não confundir com o time de 3 cores). A doce atriz Mel Lisboa foi aluna do curso;
Falando em doce, o refrigerante mais doce do mundo (Mineirinho) foi fabricado aqui por muitos anos;

Aqui surgiu o Partido Comunista Brasileiro (PCB) em 1922. O PDT é muito forte por aqui, tem afinidades com o regime de Fidel chegando a promover um evento cultural chamado “Niterói encontro com Cuba”;

O maior complexo de fortes e fortalezas do Brasil é nosso e a menor ciclovia do mundo também! (100m no calçadão da praia de Icaraí);

A herança indígena é muito forte, visto que vários nomes de praias e bairros são de origem indígena;

E por último, mas não menos importante: os primeiros dados divulgados pelo Censo do IBGE revelam que Niterói é um harém. Minha terrinha é a quinta cidade do país com a maior proporção de mulheres: 53,69%. Em números absolutos, são 35.963 a mais do que homens. Eu sugiro adotarmos a poligamia!

*Cacique indígena (Araribóia significa “cobra feroz” em tupi) que fundou a cidade, sim somos a única cidade do Brasil fundada por um índio! Em homenagem a ele há uma estátua defronte a estação das barcas em Niterói (barcas que fazem a travessia Rio - Niterói pela Baia de Guanabara).

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A violência é tão fascinante e nossas vidas são tão normais*

* Verso da canção Baader-meinhof blues, música do primeiro disco da Legião urbana cujo título é o nome de uma organização terrorista alemã de extrema esquerda.


Podia estar aqui escrevendo sobre os bons momentos que tem acontecido na minha vida ultimamente, sobre fotografias, sobre ontem ter terminado a UFRJ e ter saído de lá com 2 diplomas depois de 6 anos, mas essa onda de ataques no Rio de Janeiro me brochou totalmente a escrever alguma coisa e me faz perguntar porque infelizmente, nós sociólogos só aparecemos em eleições e situações de violência urbana...

Crônica da cidade do Rio de Janeiro *

No alto da noite do Rio de Janeiro, luminoso, generoso, o Cristo Redentor estende seus braços. Debaixo desses braços os netos de escravos encontram amparo.
Uma mulher descalça olha o Cristo, lá de baixo, e apontando seu fulgor, diz muito tristemente:
- Daqui a pouco não estará mais aí. Ouvi dizer que vão tirar ele daí.
- Não se preocupe – tranqüiliza uma vizinha. – Não se preocupe: Ele volta.
A polícia mata muitos, e mais ainda mata a economia. Na cidade violentas soam tiros e também tambores: os atabaques ansiosos de consolo e de vingança, chamam os deuses africanos. Cristo sozinho não basta.


* Eduardo Galeano Livro dos abraços, pág 78. 1989 (mas super atual)

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Eduardo Galeano

Admito que literatura nunca foi meu forte, pois meu negócio é mais música. O maior contato com livros que tive na vida foi na faculdade, quando me vi envolto por xeroxs e livros de sociologia, antropologia, história e ciência política. Porém em 2008 isso mudou porque descobri um escritor uruguaio chamado Eduardo Galeano. Li um livro dele chamado “Futebol ao sol e à sombra” e me encantei. O livro contava a história do futebol desde suas origens até a copa de 2002, entremeada por causos do futebol brasileiro, uruguaio e argentino. Galeano também é autor de “As veias abertas da América latina”, clássico livro de história que começa com uma frase genial: “Há dois lados da divisão internacional do trabalho: um em que alguns países especializam-se em ganhar, e outro em que se especializam em perder. Nossa comarca do mundo, que hoje chamamos de América Latina, foi precoce: especializou-se em perder desde os remotos tempos em que os europeus do Renascimento se abalançaram pelo mar e fincaram os dentes em sua garganta”.Meu livro favorito do Eduardo Galeano é “O livro dos abraços”, uma série de pequenos contos e boas histórias. A maneira como ele escreve é cativante, se um dia eu conseguir com a fotografia fazer 1/9 do que ele faz com as letras já me darei por satisfeito =)
Segue abaixo um trecho do livro, espero que gostem:


A celebração da voz humana/2



Tinham as mãos amarradas, ou algemadas, e ainda assim os dedos dançavam, voavam, desenhavam palavras. Os presos estavam encapuzados; mas inclinando-se conseguiam ver alguma coisa, alguma coisinha, por baixo. E embora fosse proibido falar, eles conversavam com as mãos.
Pinio Ungerfeld me ensinou o alfabeto dos dedos, que aprendeu na prisão sem professor: - Alguns tinham caligrafia ruim – me disse -. Outros tinham letra de artista.
A ditadura uruguaia queria que cada um fosse apenas um, que cada um fosse ninguém: nas cadeias e quartéis, e no país inteiro, a comunicação era delito.
Alguns presos passaram mais de dez anos enterrados em calabouços solitários do tamanho de um ataúde, sem escutar outras vozes além do ruído das grades ou dos passos das botas pelos corredores. Fernández Huidobro e Mauricio Rosencof, condenados a essa solidão, salvaram-se porque conseguiram conversar, com batidinhas na parede. Assim contavam sonhos e lembranças, amores e desamores; discutiam, se abraçavam, brigavam; compartilhavam certezas e belezas e também dúvidas e culpas e perguntas que não têm resposta.
Quando é verdadeira, quando nasce da necessidade de dizer, a voz humana não encontra quem a detenha. Se lhe negam a boca, ela fala pelas mãos, ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for. Porque todos, todos, temos algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada ou perdoada”.



• P.s: a trilha sonora ideal para ler os livros acima é o disco Clandestino do artista Manu Chao. Um verdadeiro manifesto sonoro em homenagem a América Latina, não por acaso o próprio Galeano é citado nos agradecimentos do disco. A música titulo reflete o drama dos milhares de imigrantes ilegais que “por não carregarem papéis (documentos) são proibidos de viver pelas autoridades”.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Lost in the supermarket *

* 8ª música do ótimo disco London Calling do The Clash


Hoje fui no mercado com meus pais, depois de uns 7 meses sem ir ao mercado fazer compras de mês. Além das ofertas do mês, pude notar o quanto o supermercado funciona como uma espécie de laboratório para a observação do comportamento humano, já que é antiético usar humanos para pesquisas sociológicas, eu recomendo o supermercado como posto avançado de observação antropológica e nas linhas que seguem vou tentar explicar o porque.

- como um determinado produto em liquidação provoca as reações mais extremadas nas pessoas. Em alguns casos não me admiraria se as pessoas sentassem em cima dos produtos para impedir as outras pessoas de comprá-los

- a falta de educação das pessoas; atravessar carrinhos no meio do corredor impedindo a circulação é algo corriqueiro. Total falta de senso prático e egoísmo aflorado. Desbravar os corredores requer um exercício de paciência sobrenatural.

- supermercado também é cultura. Como? Eu explico: a fotografia mais cara da história se chama 0.99 centavos e foi feita num supermercado. O autor é o alemão Andréas Gursky que conseguiu módicos 3 milhões de dólares por esta foto http://passmethemalkplease.files.wordpress.com/2008/04/gursky.jpg

- ainda no campo da arte, hoje pela primeira vez na vida vi uma lata de sopa Campbells que inspirou o artista Andy Warhol a fazer este quadro da pop-art: http://www.osarmenios.com.br/wp-content/uploads/campbell-parede.jpg


Tais observações foram feitas embaladas pelo som de Cachorro Grande, Jota Quest e Xuxa nos alto-falantes do mercado...