terça-feira, 16 de novembro de 2010

Eduardo Galeano

Admito que literatura nunca foi meu forte, pois meu negócio é mais música. O maior contato com livros que tive na vida foi na faculdade, quando me vi envolto por xeroxs e livros de sociologia, antropologia, história e ciência política. Porém em 2008 isso mudou porque descobri um escritor uruguaio chamado Eduardo Galeano. Li um livro dele chamado “Futebol ao sol e à sombra” e me encantei. O livro contava a história do futebol desde suas origens até a copa de 2002, entremeada por causos do futebol brasileiro, uruguaio e argentino. Galeano também é autor de “As veias abertas da América latina”, clássico livro de história que começa com uma frase genial: “Há dois lados da divisão internacional do trabalho: um em que alguns países especializam-se em ganhar, e outro em que se especializam em perder. Nossa comarca do mundo, que hoje chamamos de América Latina, foi precoce: especializou-se em perder desde os remotos tempos em que os europeus do Renascimento se abalançaram pelo mar e fincaram os dentes em sua garganta”.Meu livro favorito do Eduardo Galeano é “O livro dos abraços”, uma série de pequenos contos e boas histórias. A maneira como ele escreve é cativante, se um dia eu conseguir com a fotografia fazer 1/9 do que ele faz com as letras já me darei por satisfeito =)
Segue abaixo um trecho do livro, espero que gostem:


A celebração da voz humana/2



Tinham as mãos amarradas, ou algemadas, e ainda assim os dedos dançavam, voavam, desenhavam palavras. Os presos estavam encapuzados; mas inclinando-se conseguiam ver alguma coisa, alguma coisinha, por baixo. E embora fosse proibido falar, eles conversavam com as mãos.
Pinio Ungerfeld me ensinou o alfabeto dos dedos, que aprendeu na prisão sem professor: - Alguns tinham caligrafia ruim – me disse -. Outros tinham letra de artista.
A ditadura uruguaia queria que cada um fosse apenas um, que cada um fosse ninguém: nas cadeias e quartéis, e no país inteiro, a comunicação era delito.
Alguns presos passaram mais de dez anos enterrados em calabouços solitários do tamanho de um ataúde, sem escutar outras vozes além do ruído das grades ou dos passos das botas pelos corredores. Fernández Huidobro e Mauricio Rosencof, condenados a essa solidão, salvaram-se porque conseguiram conversar, com batidinhas na parede. Assim contavam sonhos e lembranças, amores e desamores; discutiam, se abraçavam, brigavam; compartilhavam certezas e belezas e também dúvidas e culpas e perguntas que não têm resposta.
Quando é verdadeira, quando nasce da necessidade de dizer, a voz humana não encontra quem a detenha. Se lhe negam a boca, ela fala pelas mãos, ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for. Porque todos, todos, temos algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada ou perdoada”.



• P.s: a trilha sonora ideal para ler os livros acima é o disco Clandestino do artista Manu Chao. Um verdadeiro manifesto sonoro em homenagem a América Latina, não por acaso o próprio Galeano é citado nos agradecimentos do disco. A música titulo reflete o drama dos milhares de imigrantes ilegais que “por não carregarem papéis (documentos) são proibidos de viver pelas autoridades”.

3 comentários:

Bárbara disse...

Sensacional!
ótima escolha, agora fiquei com vontade de ler esses livros aí citados...
Já começaram a aparecer planos para as minhas férias... rsrs

Aurea disse...

O Galeano tem mesmo esse dom de encantar-nos com a sua literatura, conduzindo-a de maneira que nos envolve, seja quando fala de política, futebol ou até mesmo das coisas simples da vida, como no livro dos abraços, que por coincidência também é o meu favorito, dos livros que já li dele! Ótima dica, adoreiiii!!!
Beijos ;*
Lídia

Mel. disse...

Muito bacana, eu conheci o Galeano através do "veias...", obviamente... Só posso concordar com você, e ratificar que a escrita do cara é deveras envolvente.

boa escolha.